
No verão de 2024, eu estava na costa de Belize, embarcado em um veleiro com meu sócio Paulo Sanford. Esse lugar na América Central é famoso pelo mergulho nos corais e com tubarões. O local é paradisíaco. Mas um detalhe chamou a atenção de todos, especialmente de Paulo: as rêmoras, peixes que possuem uma nadadeira dorsal modificada, que se assemelha a uma ventosa. Graças a ela, as rêmoras conseguem se fixar em grandes animais e viajar longas distâncias. Rêmoras e tubarões viajam juntos. Paulo teve um insight de relacionar as rêmoras e os tubarões com os Fundos de Private Equity e as investidas.
A relação entre esses animais é classificada como comensalismo, onde uma espécie é beneficiada sem prejudicar a outra. A rêmora, fixada na pele do tubarão, percorre grandes distâncias, alimentando-se dos restos de comida, enquanto o tubarão não é prejudicado por esta relação.
O tubarão é uma máquina de caça. Sente o cheiro de uma gota de sangue a centenas de metros. Tem a força de ataque. Os dentes afiados. É um caçador feroz, que observa suas presas, ataca de maneira objetiva e tem foco. A rêmora é um passageiro. Nessa relação é quase um acompanhante dos acontecimentos. A rêmora sabe seu papel. Ela é guiada pelo tubarão e não determina o caminho nem os ataques. A rêmora não manda no tubarão.
Fundos de Private Equity têm muitos tipos de relação com as investidas. Um desses tipos pode ser análogo ao comensalismo, quando o Fundo tem uma participação minoritária, usufruindo da jornada do empreendedor. Uma tentação clássica é o Fundo se colocar na posição de ensinar e querer operar a empresa no lugar do empreendedor, quando está numa posição minoritária.
Teoricamente o Fundo escolheu essa posição porque encontrou um “tubarão”, que conhece o negócio, sabe operar, tem a força mental e a maturidade empresarial para a execução. Como a rêmora, o Fundo pode usufruir da força de caça do tubarão, mas nunca querer assumir seu papel de condutor.
O comportamento humano tem meandros nem sempre previsíveis. Gestores de Fundos, muitas vezes, cedem à tentação de inverter a posição com suas investidas. Cometem o erro de tentar domesticar o tubarão. Se conseguirem, se o tubarão ceder, caberá à rêmora levar o tubarão, agora desfalecido, nas costas. A certeza que temos é que a rêmora sucumbirá. E o tubarão, de caçador, será caça. É bom lembrar que o mar dos negócios também é habitado por orcas, exímias caçadoras de tubarões.
No fim das contas, é preciso respeitar os papéis. O poste não faz xixi no cachorro. E no mundo dos negócios, assim como na natureza, quem inverte as ordens essenciais, inevitavelmente se perde.